O diamante
Luís Fernando Veríssimo
Um dia, Maria chegou em casa da
escola muito triste. - O que foi? - perguntou a mãe de Maria. Mas Maria nem
quis conversa. Foi direto para o seu quarto, pegou o seu Snoopys e se atirou na
cama, onde ficou deitada, emburrada.
A mãe de Maria foi ver se Maria
estava com febre. Não estava. Perguntou se Maria estava sentindo alguma coisa.
Não estava. Perguntou se estava com fome. Não estava. Perguntou o que era,
então.
- Nada - disse Maria.
A mãe resolveu não insistir.
Deixou Maria deitada na cama, abraçada com o seu Snoopy, emburrada. Quando o
pai de Maria chegou em casa do trabalho, a mãe de Maria avisou:
- Melhor nem falar com ela...
Maria estava com cara de poucos
amigos. Pior. Estava com cara de amigo nenhum.
Na mesa do jantar, Maria de
repente falou:
- Eu não valo nada. O pai de
Maria disse:
- Em primeiro lugar, não se diz
"eu não valo nada". É "eu não valho nada". Em segundo
lugar, não é verdade. Você valhe muito. Quer dizer, vale muito.
- Não valho.
- Mas o que é isso? - disse a mãe
de Maria. - Você é a nossa filha querida. Todos gostam de você. A mamãe, o
papai, a vovó, os tios, as tias. Para nós, você é uma preciosidade.
Mas Maria não se convenceu. Disse
que era igual a mil outras pessoas. A milhões de outras pessoas.
- Só na minha aula tem sete
Marias!
- Querida... - começou a dizer a
mãe. Mas o pai interrompeu.
- Maria - disse o pai -, você
sabe por que um diamante vale tanto dinheiro?
- Porque é bonito.
- Porque é raro. Um pedaço de
vidro também é bonito. Mas o vidro se encontra em toda parte. Um diamante é
difícil de encontrar. Quanto mais rara é uma coisa, mais ela vale. Você sabe
por que o ouro vale tanto?
- Por quê?
- Porque tem pouquíssimo ouro no
mundo. Se o ouro fosse como areia, a gente ia caminhar no ouro, ia rolar no
ouro, depois ia chegar em casa e lavar o ouro do corpo para não ficar suja.
Agora, imagina se em todo o mundo só existisse uma pepita de ouro.
- Ia ser a coisa mais valiosa do
mundo.
- Pois é. E em todo o mundo só
existe uma Maria.
- Só na minha aula são sete.
- Mas são outras Marias.
- São iguais a mim. Dois olhos,
um nariz...
- Mas esta pintinha aqui nenhuma
delas tem.
-É...
- Você já se deu conta de que em
todo o mundo só existe uma você?
- Mas, pai...
- Só uma. Você é uma raridade.
Podem existir outras parecidas. Mas você, você mesma, só existe uma. Se algum
dia aparecer outra você na sua frente, você pode dizer: é falsa.
- Então eu sou a coisa mais
valiosa do mundo.
- Olha, você deve estar valendo
aí uns três trilhões... Naquela noite a mãe de Maria passou perto do quarto
dela e ouviu Maria falando com o Snoopy:
- Sabe um diamante?
(Luis Fernanado Veríssimo, O
santinho. 3.ed. Porto Alegre, 1991)
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